Há menos de 20 anos Moçambique saiu de um período de guerras que assolou o país, deixou muitos mortos e profundas marcas em sua cultura. De 1976 a 1992 foi a guerra civil. Antes disso, de 1964 a 1975 foi a guerra pela independência. Assim, a construção do país ainda está por acontecer. Afinal, antes de 1975 era colônia de Portugal. Depois, quando se ia iniciar a construção da identidade do novo país livre, veio a guerra civil.
Nesse momento que estamos vivendo aqui, estamos justamente acompanhando a construção dessa identidade, a formação de um país. Essa experiência é maravilhosa. Cansativa, às vezes, confesso, mas riquíssima. Por exemplo, uma discussão ainda muito insipiente por aqui, mas que começa a dar sinais de que existe é a da adoção do Acordo Ortográfico dos países de língua portuguesa, sobre o qual falei no post “Acordo?”.
O fato é que no meio dessa confusão de deixar de ser colônia, criar suas próprias regras, leis, normas e conceitos, mas tudo durante uma guerra civil, algumas questões não foram sequer tratadas. O nosso querido português (o idioma, deixo claro), é uma dessas. Como explicou o docente da Universidade Pedagógica, Agostinho Goenha, em artigo publicado no jornal O País no dia 26 de fevereiro, “Em Moçambique, a norma linguística adoptada como referência é a do português europeu”, porém “Em conformidade com a documentação moçambicana consultada, nenhum Decreto-Lei ou dispositivo legal refere explicitamente que a norma padrão do Português em Moçambique é a européia”.
Ou seja, quando éramos colônia, naturalmente, o idioma oficial era do colonizador. Ao se conquistar a independência, apenas se definiu que o idioma oficial seria o português, até mesmo para contribuir para a comunicação da nação, visto que originalmente o território de Moçambique tem várias línguas diferentes e, sem o português como elo de ligação o norte não falaria com o sul, que não entenderia o centro.
Porém, com tanta coisa a se construir e com o idioma já sendo falado e escrito aqui e ali da forma como os portugueses o fazem, os governantes nem se deram conta que seria necessário definir as normas do idioma em seu país. Nada se fez.
Assim como nada está sendo feito com relação ao acordo ortográfico, que seria um bom momento para regulamentar a questão. No mesmo artigo, Agostinho observa que o governo deveria ao menos sinalizar se tem intenção de assinar o acordo e traçar um calendário, ainda que a longo prazo (para ser compatível com a realidade social e financeira do país).
Agora, se o português adotado aqui baseia-se no português europeu (ao menos me parece que é isso que se tenta fazer), então, com Portugal já se movimentando para adotar o Acordo Ortográfico, o mesmo deveria acontecer por aqui. No entanto, não há sinais nesse sentido.
Nas escolas, os professores fogem do assunto. Nas ruas, onde apenas 30% da população fala português, as pessoas nem sabem que o assunto existe. E no dia a dia o idioma vai sendo cada vez mais diverso do europeu, não igual ao brasileiro e totalmente sem documentação.
Leia mais na matéria Acordo ortográfico divide académicos, do jornal O País.
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