Goste ou não goste…

Estive um tempo com um questionamento na cabeça: necessariamente eu tenho que gostar dos artistas que apresento na Quinta Quente? Depois lembrei que até já apresentei alguns dos quais não sou a maior fã (nomeadamente Cesária Évora e Azagaia, por exemplo). Não que eu não goste totalmente, mas há restrições para cada um. Então, resolvi trazer uma cantora que não é das minhas preferidas, mas é uma referência entre os artistas que nasceram em África e acho importante as pessoas a conhecerem.

Sara Tavares nasceu em 1978 em Cabo Verde e, além de cantora, é compositora e guitarrista. Ela foi ainda jovem para Portugal e começou a ser conhecida como compositora de Gospel, Funk e Soul. Aos poucos, incorporou o estilo africano em suas composições. Mas, mesmo com o ritmo forte e alegre que predomina nas músicas africanas, muitas das composições de Sara Tavares mostram um outro lado do som africano, com melancolia e letras que falam das tristezas do coração.

O álbum Balancé, de 2006, tem todas as músicas compostas e escritas por ela, que também toca vários dos instrumentos. Nele pode-se apreciar todo seu talento musical e sua afinada voz (ainda que um pouco aguda demais para o meu gosto — daí a ressalva do primeiro parágrafo).

Vamos ouvir Balancê, que é uma das poucas com tom mais alegre da artista.

Balancê

Como vi dançar no Zimbabué
Quero também contigo gingar
Uma dança nova
Mistura de Semba com Samba
De Mambo com Rumba
Tua mão na minha
E a minha na tua
Balancê ye
Balança ya
Swinga para lá
Swinga pra cá ye
Balancê ye
Balança ya
Maria José
Swing no pé
Senão chega p’ra lá ye
Somos livres para celebrar
Somos livres para nos libertar
Como crianças brincando
Crianças sorrindo
Crianças sendo crianças… ah!
Como crianças brincando
Crianças sorrindo
Crianças…
Balancê ye
Balança ya
Swinga para lá
Swinga pra cá ye
Balancê ye
Balança ya
Maria José
Swing no pé
Senão chega p’ra lá ye
Adoro quando te deixas levar assim
Fechas os olhos e danças só para mim
Uma dança tua
Mistura de não vem que não tem
Com um sorriso porém que me diz que o teu desdém
É só a manhã de alguém
Que diz que vai mas que vem
Me engana que eu gosto
Balancê ye
Balança ya
Swinga para lá
Swinga pra cá ye
Balancê ye
Balança ya
Maria José
Swing no pé
Senão chega p’ra lá ye
Balancê ye
Balança ya
Swinga para lá
Swinga pra cá ye
Balancê ye
Balança ya
Maria José
Swing no pé
Senão chega p’ra lá ye

Visite também o site da artista, que tristemente só está escrito em inglês.

Musicalidade que vem do berço

Para começar 2011 com muita empolgação, Dança ma mi criola, com Tito Paris, um dos ícones da música moderna luso-africana. Tito Paris como que hipnotiza suas platéias, seja pela energia com que se apresenta ou pela melancolia de algumas de suas canções.

Seu dedilhar é como uma carícia na guitarra, que agradece emanando os melhores sons. Sons esses que combinam perfeitamente com a voz rouca de Tito, que lembra os melhores intérpretes de blues. Os ouvidos se derretem e agradecem também. E o corpo não consegue ficar parado.

Essa musicalidade toda está no sangue de Tito. Os pais e os avós eram músicos, assim como a maioria de seus oito irmãos. Nesse ambiente, aos sete anos já tocava guitarra. Compôs para Bana, Luís Morais e Cesária Évora.

Caboverdiano, Tito está em Lisboa desde 1982, difundindo os gêneros musicais africanos como morna, funaná e coladera e misturando tudo isso com jazz, rock, salsa e até flamenco.

Seu primeiro álbum foi totalmente instrumental, em 1985, Fidjo Maguado. Dança ma mi criola, de autoria de Toy Vieira, é a música que se tornou sua marca e foi gravada em 1994.

Dança Ma Mi Criola

Dança ma mi criola cola na mim
Pensa na passá sabe num coladera

Sabura é lá na nôs terra Cabo Verde
Lá nô ta sinti na meio d’nôs tradiçon

Tchiga na mim bô perta’m forte quê pa’m sinti
Calor di bô morininha óh Cabo Verde

Sabura é lá na nôs terra Cabo Verde
Lá nô ta sinti na meio d’nôs tradiçon

Veja mais sobre o artista no blog Tito Paris e no site At-Tambur.com.

10.10.10

No dia 10 do mês 10 do ano de 2010 muitas coisas importantes aconteceram no mundo. Aniversários, encontros, reencontros, prisões, libertações, viagens, novas paixões, o debate dos candidatos à presidência do Brasil na TV e, na China, a confirmação do regresso da cantora caboverdiana Cesária Évora (69 anos) aos palcos. Há cinco meses ela havia sofrido uma cirurgia no coração e desde então não se apresentava.

Sua atuação nesse 10.10.10 foi de pouco mais de meia hora, no Teatro do Exército Popular da Libertação, em Pequim, com seus pés sempre descalços (prática, aliás, adotada por outras cantoras africanas). O concerto fez parte dos eventos do Dia de Cabo Verde na Expo2010.

Cesária Évora nasceu em Mindelo, na ilha de São Vicente, no país-arquipélago Cabo Verde. Ficou conhecida como a “diva dos pés descalços” e é a cantora caboverdiana de maior reconhecimento internacional. Em sua carreira, interpretou diversos gêneros musicais, mas o que mais a marcou foi o morna, gênero popular, tocado com instrumentos acústicos, com letras que falam de tristeza, mágoa e desejos impossíveis de serem realizados.

Desde pequena, Cesária gostava de cantar e fazia apresentações aos domingos na praça principal da sua cidade, acompanhada por seu irmão, Lela, no saxofone. Aos 16 anos conheceu um marinheiro chamado Eduardo que ensinou à Cesária os tradicionais estilos da música caboverdiana como a morna e a coladera.

Ela passou, então, a cantar em bares e hotéis. Aos 20 anos foi contratada como cantora pela companhia de pesca Congelo e passou a apresentar-se, basicamente, em jantares da empresa.

Em 1975, quando Cabo Verde conquistou a independência, Évora ainda não era muito popular e as dificuldades econômicas a fizeram parar de cantar para trabalhar em outras áreas que permitiam o melhor sustento da família. Dez anos afastada de seu próprio dom acabaram por levá-la ao alcoolismo.

Então, encorajada pelo compatriota Bana, realizou concertos em Portugal, onde ele estava exilado. De lá, foi convidada a ir para Paris, onde gravou, em 1988, o álbum “La diva aux pied nus” (a diva dos pés descalços). Aos 47 anos de idade, tornou-se internacionalmente conhecida e aplaudida.

Abaixo, Sodade, uma das mais conhecidas mornas interpretadas por Cesária Évora. Gosto do ritmo quase alegre que chega aos ouvidos ao mesmo tempo que uma letra lírica, quase triste. A letra é em crioulo caboverdiano, fácil de ser compreendida, mas, como encontrei tradução, a publico também.

Quem mostra’ bo (quem te mostrou)
Ess caminho longe? (esse caminho longe?)
Quem mostra’ bo (quem te mostrou)
Ess caminho longe? (esse caminho longe?)
Ess caminho (esse caminho)
Pa São Tomé (para são tome?)

Sodade sodade (saudade, saudade)
Sodade (saudade)
Dess nha terra Sao Nicolau (da minha terra são nicolau)

Si bô ‘screvê’ me (se me escreveres)
‘M ta ‘screvê be (eu escrevo-te)
Si bô ‘squecê me (se me esqueceres)
‘M ta ‘squecê be (eu esqueço-te)
Até dia (até ao dia)
Qui bô voltà (que voltares)

Sodade sodade (saudade, saudade)
Sodade (saudade)
Dess nha terra Sao Nicolau (da minha terra são nicolau)

Aqui, um esclarecedor texto sobre a letra da música.

Conheça o site oficial de Cesária Évora.

Saiba mais sobre a cantora, visitando a Wikipédia.

Veja mais sobre o espetáculo na Expo2010, na Agência AngolaPress.

Veja também o site oficial da Expo2010.

Espaço para os Palops

Dando continuidade à apresentação de artistas dos Palops na Quinta Quente, como já vimos em Qual é a música? e Quinta Quente no Quinto — quando um autêntico representante dos Palops, o amigo David Borges, apresentou-se —, vamos hoje à Cabo Verde.

Mas antes, o que são os Palops, sigla muito falada aqui em África? São os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, nomeadamente Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique e São Tomé e Príncipe.

Por indicação do artista do nosso blog, David, trago hoje Bana. Nascido em 1932, começou a fazer sucesso na década de 1960, quando saiu de Cabo Verde pela primeira vez e foi apresentar-se em Dacar, fazendo espetáculos e participações em rádio.

Em 1966, juntamente com Luís Morais (no clarinete), Morgadinho (no trompete) e Toy de Bibia (na guitarra), formou o Conjunto Voz de Cabo Verde. O auge de sua carreira foi na década de 70, quando passou a produzir discos e chegou a lançar cerca de cinquenta do que seriam hoje os CDs. É considerado um embaixador da cultura musical caboverdiana pelo mundo.

Este mês ele foi entrevistado pelo programa Nova África, da TV Brasil. Confira aqui.

Com sua influência no meio musical, ajudou a formar e lançar músicos atualmente consagrados como Cesária Évora, Tito Paris, Paulino Vieira e outros que ainda veremos aqui no Mosanblog.

Com vocês, Bana, em dois momentos distintos, que mostram sua versatilidade e grande capacidade de interpretação: