Quando mudei para Maputo, mal informada que era (não que não tenha buscado informações, mas elas chegam distorcidas do outro lado do oceano), imaginava que encontraria fácil elefantes e girafas. Assim como tem gringo que acha que em São Paulo ou no Rio de Janeiro é normal cruzar com macacos e cobras na rua. Eu imaginava que perto mesmo da cidade haveria lindos campos onde eu poderia ver elefantes a correr soltos pela natureza. Ai, vergonha de mim mesma.
Mas confesso tal pensamento tolo, para contar que não só não é assim — eles estão nos parques, nas reservas, e há que se pegar estrada para chegar lá — como os animais que aqui encontro são muito diferentes desses: são pavões, com os quais não esperava me deparar a todo momento.
Tudo bem que tem a ver com o local que moramos, ao lado da residência do presidente da República de Moçambique. Não há pavões por todas as ruas, como se fossem cães ou gatos sem donos. Os pavões que aqui encontro tem dono: o próprio morador da citada residência, o presidente.
É muito simpático vê-los pela janela, nas árvores em frente à nossa casa ou nos telhados dos vizinhos. Ou mesmo encontrar com eles ao sair de casa. Quando tentei saber o motivo dos pavões pelas ruas foi que descobri serem da presidência, por isso estão nas redondezas do bairro Polana Cimento A.
Aliás, isso me causa muitas situações de “frio na barriga”, porque saio com o Otto para passear e quando ele encontra os pavões, corre atrás deles latindo. E eu desesperada: “não Otto, eles são do presidente!”. Imaginem que feio: o cão sem raça definida da estrangeira querendo brigar com o pavão da presidência. Nem quero pensar o problema que seria não segurar bem a guia do Otto.
Enfim, mas como essas aves chegaram por aqui ainda é um mistério para mim. Já encontrei várias versões. Estava na busca de uma oficial para publicar, mas como quase seis meses já se passaram e ela não apareceu, resolvi divulgar. Se alguém souber alguma coisa, peço que enviem para mim pelos comentários.
Primeiro ouvi que os pavões foram oferecidos por Julius Nyerere (presidente da Tanzânia logo após a independência) ao então presidente de Moçambique, Samora Machel. Isso lá nos idos do fim da década de 1970. Não sei quantos teriam sido oferecidos, mas, de lá para cá, os pavões devem ter procriado. Talvez haja algum remanescente do período ainda, se considerarmos que eles podem viver até 50 anos.
Outra versão que ouvi é que esses animais tinham sido usados durante a guerra pela independência, como defesas nos acampamentos. Afinal, ele é um guardião nato, que passa a noite no topo das árvores e grita forte assim que aparecem estranhos por perto. Por isso, é conhecido como guardião da floresta. Após a guerra, teriam sido trazidos para a presidência.
Depois, no Diário de um Sociólogo, encontrei o comentário de Zé Carlos, narrando que vivia em uma rua aqui ao lado e também via diariamente as “lindas e portentosas aves”. Ele não explica a origem dos animais, mas conta um fato interessante: corria em segredo a história de que um dos pavões macho, o mais imponente de todos, teria “encarnado o ‘espírito’ do falecido Presidente Samora Machel”. Tal crença rendeu ao animal algumas regalias, como ser presenteado com cálices de vinho do Porto ou Martini, que eram deixados no passeio e “ele bebericava, abrindo num lindo arco-íris todas as suas belas penas e depois saía voando em vôo rasante, por baixo das barreiras, em gritos poderosos, colocando as sentinelas em sentido, como se do próprio Presidente se tratasse!”
Saiba mais sobre pavões visitando esses sites:
– InfoEscola
– Portal São Francisco
– Wikipédia
E conheça os pavões daqui pelas fotos abaixo. Observem que é um verdadeiro exército (e nas fotos nem estão todos os que moram por aqui) e que eles gostam de se admirar na lataria dos carros. Não é sem razão que o bicho é conhecido como vaidoso: