Pelo menos na área das relações internacionais, assim tem sido.
Primeiro, vamos conhecer o tal rio.
Agora, pode se ajeitar na cadeira, porque lá vem a história…
Essa semana, várias vezes acompanhamos nos noticiários daqui matérias sobre a navegação experimental no rio Zambeze praticada pelo governo do Malawi.
No dia 23 de outubro último, o presidente do Malawi, Bingo wa Mutharika, estava em um evento — inauguração do porto de Nsanje — a aguardar uma embarcação que deveria chegar no rio Chire (no mapa abaixo grafado Shire), que banha a parte sul do Malawi e deságua no Zambeze, para depois encontrar o Oceano Índico.
No entanto, wa Mutharika ficou na espera. A embarcação esperada tinha sido interceptada ainda em Moçambique. A razão é que o governo moçambicano entende que seu vizinho deveria aguardar o término de estudos de viabilidade e de impacto ambiental da navegação nos rios Chire e Zambeze antes de iniciar as navegações.
Moçambique alega ainda que os presidentes do Zimbabwe e da Zâmbia foram convidados formalmente para o evento em Malawi, enquanto Moçambique, diretamente interessado, recebeu uma nota verbal ao seu Alto Comissariado naquele país, solicitando a confirmação da participação de seu presidente, Armando Guebuza.
Para completar o estrago diplomático, o adido militar da missão diplomática do Malawi em Moçambique, James Kalipinde, encontrava-se na embarcação e teria saído de Maputo sem a devida autorização do Ministério da Defesa Nacional (MDN), procedimento padrão.
O adido militar foi detido pela Polícia da República de Moçambique (PRM), tendo ficado na cidade de Quelimane (província da Zambézia) até o dia seguinte, quando se confirmou que ele era um diplomata.
Por seu lado, o governo do Malawi, na figura do alto comissário em Moçambique, Martin Kansichi, diz estar indignado com a forma como o governo moçambicano trata o processo. Para ele, Moçambique teria quebrado acordo entre os dois países que, pelo entendimento malawiano, previa a realização de uma viagem experimental para provar a navegabilidade dos rios até o porto de Nsanje.
“Existem documentos que comprovam que existe um acordo que prevê a realização de uma viagem experimental. O Malawi é um país que respeita os procedimentos” afirmou Kansichi em matéria do jornal O País. De acordo com o embaixador malawiano, esta viagem experimental não necessita estudo de viabilidade.
Kansichi manifestou-se ainda indignado com declarações do ministro dos Negócios Estrangeiros de Moçambique, Oldemiro Baloi, a respeito do caso. Em entrevista coletiva, Baloi qualificou os malawianos como impacientes e os acusou de estar a forçar o avanço do projeto, sem observar a necessidade dos estudos de viabilidade e de impacto ambiental.
Turbulência histórica
As relações entre os dois países iniciaram na década de 1960, quando o Malawi conquistou a independência. Depois de 1975, independência de Moçambique, o relacionamento ficou tenso, devido às diferenças nas ideologias políticas seguidas por cada um dos países.
No artigo Relações entre Moçambique e Malawi, Saite Júnior explica que Moçambique seguiu a orientação socialista e Malawi era apoiado pelos países capitalistas, tendo também se tornado aliado dos regimes colonial fascista português e do apartheid da África do Sul.
Entre 1976 e 1992 Moçambique viveu sob uma guerra civil e Malawi apoiou a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), contra a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), movimento reconhecido internacionalmente por ter lutado pela independência do país e negociado com Portugal por meio dos Acordos de Lusaka. A Frelimo foi a força política que assumiu o poder de forma constitucional.
No final do século, no entanto, Moçambique abriu-se ao mercado internacional do ocidente, rendendo-se ao regime democrático liberal e ampliando suas relações diplomáticas. Do outro lado, com o fim do apartheid, o Malawi perdeu o seu aliado estratégico, e devido à posição geográfica, viu-se na obrigação de rever suas relações, para garantir acesso aos corredores de desenvolvimento de Nacala e Beira e poder alcançar o Oceano Índico.
As relações vinham sendo pacíficas até 2009, quando ocorreu o incidente de Ngaúma: agentes da polícia do Malawi invadiram Moçambique e causaram a destruição por completo de um quartel da Força de Guarda de Fronteira do distrito de Ngaúma, na província de Niassa. Meses depois, o presidente malawiano Bingo wa Mutharika, esteve em visita oficial de Estado a Moçambique e o país esperava ouvir um pedido de desculpas oficial, o que não aconteceu. Então, diante do clima tenso, wa Mutharika viu-se obrigado a interromper bruscamente a visita.
Ao longo dos anos, vários outros incidentes foram contabilizados, como o de maio deste ano, quando seis moçambicanos foram condenados à pena de morte no Malawi. Depois de negociações conseguiu-se converter as penas para prisão perpétua.
Ou seja, a relação é complicada e, nesses casos, a atenção deve ser redobrada em qualquer ação ou palavra. Fiquemos atentos.
Tenha mais informações sobre o episódio dessa semana em matéria que o Eduardo Castro fez para a Agência Brasil e publicou no ElefanteNews.
Veja mais em Zambeze: um rio de problemas e incidentes diplomáticos.
Sobre a troca de acusações, leia detalhes em Malawi considera provocatórias declarações de Baloi.
Conheça a posição dos ambientalistas, em matéria divulgada pelo blog Moçambique para Todos intitulada Ambientalistas descartam navegabilidade do Zambeze.
E saiba mais sobre a relação histórica entre os dois países, aqui, no citado artigo de Saite Júnior.
Sandra,
Estou precisando de saber ao certo qual ou quais as línguas o escritor Nelson Saúte usa em seus livros. Você tem alguma dica para me dar?
Já pesquisei em diversos sites e revistas especializadas e não consegui uma resposta certeira…
Agradeço a atenção.
Renata
(renatacabralc@gmail.com)
Oi Renata, até onde eu vi, ele escreve em português. Mas não posso dizer se é só em português ou se usa outras línguas também. Espero que algum leitor atento e conhecedor do tema possa nos ajudar.
Abraços.
Sandra.
[…] texto mais visitado foi Navegação turbulenta do rio Zambeze, publicado em 29 de outubro de […]
[…] Navegação turbulenta no rio Zambeze outubro, 20101 comentário 4 […]
Vixi essa contabilidade de incidentes só está crescendo hein? Se alguém não ceder as coisas podem esquentar, por isso sempre sou a favor da negociação!