Estamos hoje, em Maputo, na região onde, antes da chegada dos portugueses no século XV, constituiu-se o Império de Gaza, um dos maiores da África, que se expandia por parte do que hoje é a África do Sul e Zimbabwe. As principais culturas agrícolas desse povo eram de cereais (milho, sorgo, milheto e arroz) e leguminosas (basicamente feijão e amendoim), além de batata doce, mandioca e algumas hortaliças. Para completar a alimentação, havia ainda criação e caça de animais.
Quando chegaram os portugueses, esse povo foi dominado e a alimentação da região passou a sofrer influência da nova cultura. O arroz passou a ganhar mais espaço nos pratos e foram descobertos fritura e açúcar refinado. Essa influência fez com que hoje a comida preparada à base de óleo seja vista como melhor. Afinal, os portugueses subjugaram os nativos e isso faz com que eles e seus hábitos sejam vistos, muitas vezes, como superiores.
As comidas tradicionais ainda são preparadas, mas estão sempre ligadas à idéia de pobreza e falta de cultura, não de melhor valor alimentar. A pessoa come matapa (prato à base de folhas de mandioca cozidas com água de coco e amendoim pilado) porque não tem dinheiro para comprar óleo e fazer algo frito.
Talvez por isso, por essa visão de que o que é original da terra não é bom, tenhamos poucos restaurantes moçambicanos de qualidade por aqui e os que encontramos servem pouca variedade. Outra curiosidade é que já ouvi algumas histórias de moçambicanos felizes quando aprendem a fazer “comida de branco”.
Já falei no Mosanblog que sinto falta aqui de sucos naturais. Há muitas opções de frutas na região, pelo clima tropical do país. Inclusive, é muito comum encontrarmos vendedores empurrando carrinhos (chamados chovas) com grande variedade de frutas para vender: laranja, banana, uva, maçã, mamão, lichia, morango… e nada de suco natural nos bares e restaurantes. No entanto, suco de caixinha e de garrafinha sempre tem. Talvez a lógica seja a mesma: acharem que o industrializado é melhor, porque foi introduzido por outros povos.
No site Slow Food Brasil há a constatação de que a educação alimentar e a transformação para valorizar as comidas nacionais exigirão esforço de toda a sociedade moçambicana, incluindo governo e sociedade civil, na conscientização da população sobre os bons hábitos alimentares. “Aliás, comer bem não é apenas comer o que é dos outros (dos brancos, como comumente designado em Moçambique), mas também — e principalmente — a valorização das comidas tradicionais”, afirma Tomás Adriano Sitoe no artigo Colonização e independência em Moçambique: hábitos alimentares em mudança.
Saiba mais sobre o assunto lendo o artigo de Tomás Adriano Sitoe no site Slow Food Brasil.
Veja também o que foi dito no Na ponta do lápis sobre xima, um dos alimentos típicos de Moçambique.