As tranças, as mechas e a Bélia

São três assuntos e, portanto, serão três posts, afinal: uma coisa por dia, um dia de cada vez. Mas como estão relacionados, vou tratá-los em uma seqüência e o primeiro tem no título os três temas.

Vamos às tranças, uma tradição africana. Vou tentar esclarecer o que são, porque há muita confusão entre nagô, tererê, rastafari e dreadlocks.

A trança nagô é feita junto ao couro cabeludo e pode ser em linhas retas ou em desenhos desenvolvidos pelo artista trançador. Sim, porque há de ser um artista para fazer esse trabalho. Em cabelos não muito longos, como o meu, para tranças em linha reta, sem desenhos elaborados, é trabalho para duas horas e meia. Pode ser feita só com o cabelo original da pessoa ou com aplicação de outros fios. Aqui em Moçambique adoram usar os outros fios, que são comprados como “mechas”. A junção das mechas ajuda a dar um volume maior às tranças e também a manter um padrão de tamanho em toda a cabeça. Mesmo que a pessoa tenha menos volume de cabelo em determinada parte do couro cabeludo, as mechas preenchem isso e parece que o volume é homogêneo.

A nagô pode ser feita em qualquer tipo de cabelo, com qualquer tamanho e volume. Quanto mais puxa e deixa bem rente à cabeça, mais tempo dura. E a textura do cabelo também ajuda: cabelo fino como o meu, não agüenta muito, vai despontando. Além disso, eu não gosto de sentir dor (alguém gosta?) e não acho que nenhuma beleza justifica tal sofrimento, então, minha trança não foi muito puxada. Dependendo das condições do cabelo e do humor de quem o carrega com relação à dor, as tranças nagô podem durar até um mês ali, bonitinhas. Ah, e pode molhar, viu? Não pensem que fica cheirando mal a vida toda. Passa-se xampu líquido, enxagua-se bem e elas ficam bonitas e cheirosas. O ideal é depois secar com secador na temperatura fria. E para conservar mesmo, dormir de toca é a dica.

A trança nagô pode ser invertida. Ou seja, em cabelos curtos, começa da nuca e termina na testa, ficando uns fios de trancinhas pedentes em volta do rosto. Um charme pueril.

Os tererês são apliques de uma linha colorida sobre uma trança de cabelo natural. Essa linha pode ser fio médio de crochê ou lã. Um tererê pode ser feito com combinação de fios de cores diferentes ou em uma só cor. Primeiro é feita a trança. Depois, a partir da base da trança, o fio é passado pelos encontros dos cabelos, envolvendo toda a trança até a cabeça. Nessa técnica, o cabelo pode ou não ficar aparente.

Dreadlock (ou simplesmente dread) é mais uma aventura ou uma filosofia de vida do que apenas uma maneira de ter o cabelo. Eles dão o visual rastafari. Esse penteado ficou muito conhecido por ser usado pelo cantor de reggae da Jamaica, Bob Marley, e, na cultura africana, tem um significado relacionado a uma forma de afirmação da identidade negra. O dread é feito pela separação do cabelo em diversas partes que são enroladas nelas mesmas, no sentido vertical (observe, enroladas, não trançadas). A aplicação de cera de abelhas ou óleo de copaíba ajuda a manter os fios juntos e é tanto mais necessária quanto mais lisos e finos são os cabelos. O penteado dura anos. Então, conforme os cabelos crescem, devem ser enrolados nos rolos já definidos. Mais uma vez, quem pensa que o estilo tem a ver com sujeira ou deixa mal cheiro, se engana: o cabelo com dreadlock também pode ser lavado e, mais uma vez, deve ser seco com ar frio. Se foi usada cera para fixar os dreads, ela deve ser reaplicada depois do cabelo estar novamente seco. É preciso saber: como a cera fica entranhada nos fios, não é possível eliminá-la e desfazer o penteado. Então, para tirar o dread, os cabelos devem ser cortados na altura dos fios que estão nascendo.

As tranças, em geral, são técnicas desenvolvidas pelos povos africanos. A maneira de cada trança ser feita indicava, originalmente, desde o status social da pessoa até seu estado civil. Hoje, estão relacionadas mesmo à vaidade. E eu não ia deixar de fazer as minhas. Escolhi a nagô básica.

Sandra de nagô com faixa na cabeça

Sandra com nagô de perfilSandra de nagô com rabo de cavalo

Amanhã vamos falar das mechas.

Leia mais, e veja outras fotos, sobre os tipos de tranças, no site Beleza Pura.

E um post interessante sobre o assunto, no blog Casa de Luanda, que conta uma história em Angola, que também poderia ser em Moçambique.

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7 ComentáriosDeixe um comentário

  1. […] As tranças, as mechas e a Bélia agosto, 20106 comentários 3 […]

  2. […] dia ela fez tranças no meu cabelo. Enquanto ela trançava – o que demorou quase três horas – eu aproveitei para […]

  3. […] as mechas Ontem falei aqui sobre as tranças africanas. Hoje vamos tentar entender as mechas. Primeiro, o conceito: aqui chamam […]

  4. Ah que linda!!! Sabia que tive palpite de perguntar se tinha desistido das trancinhas da Bélia? hahaha Porque já faz um tempo que conversamos sobre isso…Agora virou nativa de vez!!! kkkk Mas ficou ótimo e o melhor são as histórias que você ainda vai nos contar hein? Beijos.

    P.S. Adorei a nova foto do perfil!

    Lucia Agapito

  5. Adorei ver as fotos. Estava até mostrando pra Dilma aqui e ela também adorou. Muito legal.

  6. Parabéns e obrigado pelos esclerecimentos. Eu me matava a explicar isso para as pessoas aqui e em Lisboa. Quando estava na universidade em Montpellier eu usava dreads. É, pode parecer dificil de acreditar hoje :D.
    E o penteado te ficou muito bem. Muito bem mesmo!
    Ah, e outra coisa. O lado social de fazer esses penteados. Lembro-me que são horas de conversa a fio 🙂
    Beijos

    • Pois o resultado dessas horas de conversas a fio vais ver na quarta-feira. Enquanto a trança era feita, eu registrava a minha conversa com a “trançadora” no computador. Uma riqueza!

      Aguarde.

      Beijos.
      Sandra.


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